O grande guia da auto sabotagem emocional
Daí que você conhece uma pessoa e você acha ela foda. Não, foda é pouco, você acha ela muito foda. Não, muito foda ainda é pouco, você acha ela foda pra caralho. Não, na verdade foda pra caralho ainda não faz jus, pra você ela é a pessoa que você imagina que as pessoas que são foda pra caralho imaginam quando você pede pra que elas imaginem alguém foda pra caralho. E por alguma razão que você não consegue racionalizar, seus familiares não conseguem entender e seus amigos secretamente imaginam que possa ter a ver com tráfico de órgãos, essa pessoa se interessa por você.
E você fica confuso, fica feliz, mas uma coisa que você faz questão de sempre sinalizar é o quanto você acha essa pessoa foda. E não é pouco foda, é muito foda, como você faz questão de pontuar sempre que possível. E mesmo quando não deveria ser possível mas você torna possível. Mas sendo você uma pessoa com uma autoestima levemente problemática — sabe aquelas imagens comparando uma estrela gigante com o planeta Terra, em que o planeta Terra é apenas um pontinho? então, elas também servem pra comparar a sua autoestima com a de uma pessoa normal — no processo de sinalizar o quanto você acha essa pessoa foda você acaba também sinalizando o quanto, bem, você não se acha tão foda assim. Na verdade você não se acha nem mesmo fodinha.
E daí que após um bom tempo desse processo em que você constantemente sinaliza para aquela pessoa que você acha que ela é muito foda mas não se acha tão foda assim, que você acha que ela é linda mas você não é tão bonito assim, que você acha que ela é inteligente mas você não é tão inteligente assim, um dia ela — que acreditava que vocês estavam bem pareados nesses quesitos — começa a demonstrar que realmente não te acha tão foda, tão bonito ou tão inteligente assim.
Aí você fica bem chateado com ela, claro.
Daí que a pessoa esteve ali por algum tempo. Ela tentou, ela esperou, ela se esforçou, ela criou opções, mas você seja pela razão que for — não se sentia pronto, tinha outras preocupações, precisava de mais tempo sozinho, estava priorizando o joguinho do Homem-Aranha para Playstation 4 e ainda não tinha desbloqueado todos os uniformezinhos — acabou considerando que era melhor não. A pessoa seguiu o rumo dela, você seguiu o seu rumo e estava tudo bem não fosse pelo fato de que subitamente você começou a sentir falta daquela pessoa.
E ainda que uma parte sua acredite que isso pode sim ser um sinal de que você deveria ter pedido para que aquela pessoa ficasse e você está vivendo um arrependimento genuíno por não ter se esforçado mais, a sua cabeça também se questiona se não podem estar envolvidos alguns sentimentos menos nobres. Você tá sendo falta da pessoa ou do afago no seu ego que era ter aquela pessoa por perto? Se ela não tivesse ido embora não iria estar tudo na mesma? Você realmente quer aquela pessoa de volta ou está apenas frustrado porque é muito descoordenado e não consegue passar de fase no jogo do Homem-Aranha?
Não que isso vá fazer alguma diferença, porque seja por ser cabeça dura (“eu não vou dizer não pra uma pessoa e voltar atrás logo em seguida”) ou inseguro (“com certeza ela vai falar não e eu vou ficar esmagado”) você é incapaz de pedir pra voltar com qualquer pessoa, mas enquanto você novamente não consegue alcançar o helicóptero com a teia no joguinho do Homem-Aranha você se sente um pouco mais frustrado do que nas outras 90 vezes que não conseguiu alcançar o helicóptero com a teia no joguinho do Homem-Aranha.