Working class hero
Uma das grandes lacunas que eu acho que ficam na nossa formação e na nossa educação é que a gente nunca sabe muito bem que nível de satisfação esperar da idéia de trabalho. Trabalho é uma obrigação? Trabalho é um prazer? Trabalho é uma obrigação que a gente deve tornar prazerosa? Trabalho é um prazer remunerado? Prazer remunerado não faz soar parecido com prostituição? Complicado saber, ainda mais porque as referências, como tudo na vida adulta, não fazem muito sentido.
Afinal, você tem pessoas que fazem coisas que você só faria nos seus sonhos e que se portam com um ar blasé de quem está totalmente de saco cheio, o que te faz pensar que bem, certo estava o Seu Madruga ao dizer que não existe trabalho ruim, o ruim é ter que trabalhar. Mas ao mesmo tempo você vê pessoas com trabalhos que você considera exaustivos e mal-remunerados, do tipo que você só pegaria em situações extremas, mas extremas mesmo, e que parecem transpirar felicidade lisérgica e animadona (estou olhando pra você, gari que samba sorrindo alucinadamente no carnaval e me faz sentir culpado por reclamar da vida) o que só serve pra te confundir em relação a natureza de um emprego.
Sabendo que não dá pra se balizar pela prática ou pelos exemplos da vida real, a gente vai pela teoria ou pelo que ouvimos nossos pais e professores falando, que é trabalhar com algo que te dê prazer, algo que você goste. Mas claro, ninguém nunca te explica o que fazer quando você apenas e simplesmente é ruim no que você gosta e jamais pagaria suas contas com isso, ou quando suas habilidades estão, por alguma razão, todas focadas em algo que não te dá absolutamente prazer nenhum. Você é apaixonado por futebol mas joga mal, ama literatura mas não consegue escrever nem uma lista de compras compreensível, quer ser cirurgião mas tem mãos tão firmes quanto as do Dr Estranho após a cirurgia,e por aí vai. Como você vai conciliar a idéia do prazer com a necessidade de pagar suas contas então?
Eu digo isso porque depois de, não sei, um ano e meio, eu começo a desconfiar que bem, eu não amo meu trabalho. Gosto dele, claro, gosto muito. Ele paga minhas contas, ele me dá oportunidades, estabilidade e às vezes ele até é divertido, mas acho que não amo o que eu faço. Claro,tive a fase inicial de paixão, em que tudo era lindo, cada momento era um sonho e a máquina de café me dava toda a alegria e a energia de que eu precisava, mas acho que isso…passou. Por mais que eu saiba que é absurdo um cara de 25 anos, não tão inteligente e com pouquissima experiência profissional anterior reclamar de estar num emprego como o meu, eu tenho que admitir que ali não existe paixão, não existe preocupação, não existe tesão (ainda mais porque isso feriria o código de ética da empresa, acho) não existe nem mesmo um fio de cabelo que vá ficar branco ou uma hora de sono que vá ser perdida por causa do trabalho. Porque bem, é isso que ele é pra mim, trabalho. E por mais que eu saiba que eu não vou sair de lá tão cedo (acho que faltam 34 anos e alguns meses, pela minha contagem) eu admito que isso me traz uma certa preocupação.
Porque como eu disse, faltam referências. Afinal, todo mundo se sente assim? Todos os trabalhos são assim? Se eu fosse, não sei, roteirista de quadrinhos (sim,essa é a minha visão da profissão mais legal do mundo, desculpem) eu me sentiria todo dia feliz e ficaria ansioso esperando cada minuto no trabalho e cada conversa com o chefe? Ou eu rapidamente ficaria de saco cheio por ser essa uma questão de temperamento (do tipo “eu sou um chato mesmo”) e não uma questão profissional? Eu estou hipervalorizando? Eu estou apenas sendo chato? Isso é tudo culpa da internet lenta, que está minando minha alegria de viver? Sinceramente não sei. Mas acho que tenho, aproximadamente, mais uns 34 anos e pouco pra pensar bem sobre esse assunto.